Antiga fábrica da Ford no ABC vai virar galpão
A área da antiga fábrica da Ford em São Bernardo do Campo (SP) deve ser vendida para a companhia norte-americana Prologis por R$ 850 milhões, informaram fontes a par da negociação. A expectativa é que seja construído um condomínio logístico com mais de 400 mil m2 de área locável.
Como comparação, há em toda a região do ABC paulista 480 mil m2 de galpões logísticos em desenvolvimento, em três ativos, e outros 300 mil m2 ainda em projeto, conta o analista de inteligência de mercado da consultoria Colliers, Leandro Braga.
“A localização é perfeita e você pode ter vários modelos de ocupação”, afirma Simone Santos, sócia-diretora da consultoria Binswanger SDS. Como fica dentro de um raio de 15 quilômetros do Centro de São Paulo, o espaço pode ser usado para logística de “última milha”, com entregas rápidas, ou como entreposto para entregas mais distantes. “É uma região premium para logística, está na ‘boca do gol’ para São Paulo, mas com um pé no porto de Santos”, diz Braga.
O espaço, de mais de um milhão de m2, deixou de ser usado pela montadora em outubro de 2019, quando esta anunciou sua saída do país, e foi vendido no ano seguinte para a construtora São José, por R$ 565 milhões — a construtora também arrematou outra área da Ford, em Taubaté (SP), que está locada para uma fábrica do grupo CSN. Posteriormente, o ativo em São Bernardo foi dividido em dois fundos de investimento imobiliário (FII): um é responsável pela gestão das fatias societárias da São José e de investidores do Credit Suisse, o SJAU Logística, e o BTG Pactual Logística, que entrou posteriormente no negócio. O primeiro fundo tem 75% de participação no ativo e o segundo,25%.
A transação foi divulgada em fatos relevantes dos dois fundos na noite de sexta-feira (12), quando o compromisso de compra e venda foi assinado. O nome do comprador não aparece nos documentos, e a venda ainda precisa ser aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Procurada, a Prologis informou que está em período de silêncio e que “neste momento, não se manifestará sobre o assunto em questão”. Disse ainda que, “quando possível, serão divulgadas informações oficiais sobre o tema”.
Ao final de 2021, o Valor noticiou que a São José e seus sócios já tinham os alvarás para começar a construir um condomínio logístico no local, o que sempre foi o propósito da empresa para a área.
No fato relevante do FII do BTG, consta que a tese de investimento incluía o desenvolvimento de um complexo logístico, mas que “as condições adversas de mercado ao longo dos últimos anos”, decorrentes do aumento da taxa de juros e dos custos de construção, levaram a gestora a optar pela venda do ativo. O fundo terá ganho de capital de 20,5% com a transação.
É esperado que a Prologis invista ao menos R$ 2 bilhões no empreendimento.
Segundo a Colliers, a região do ABC tem uma média de preço de locação para áreas de logística de R$ 28 por metro quadrado. Em São Bernardo, o preço sobe para R$ 32, enquanto a média nacional fechou 2023 em R$ 24,90.
Para Santos, se houver áreas para logística de última milha, o valor pode chegar aos R$ 40 por metro quadrado. Também seria possível ampliar a área locável, ao verticalizar o imóvel, chegando a 450 mil ou 500 mil m2.
Os dois especialistas em logística destacam que o terreno é “raro”, por estar em uma região urbana e adensada. Em São Bernardo há também muitas áreas de proteção ambiental, o que restringe ainda mais o espaço para exploração logística, e competição com empreendimentos residenciais. “Outro terreno desse porte, só se outra montadora sair de lá”, afirma Santos.
Ela destaca que, com o movimento de queda da taxa Selic, o mercado está mais otimista com a área de logística e há muitos desenvolvedores procurando áreas para comprar. “O dinheiro começa a surgir”, diz, mas terrenos em um raio de 30 quilômetros de São Paulo são cada vez mais difíceis.
A vacância na região do ABC está em apenas 5%, de acordo coma Colliers, e há falta de ativos de alto padrão. Por lá, ainda predominam galpões pequenos e antigos. A vacância no Estado de São Paulo era de 11% no quarto trimestre, enquanto a média nacional ficou em 10%.
Houve no ano passado a entrega de 2,3 milhões de m2 de nova área locável no país, redução ante os 2,7 milhões de 2022. Segundo Braga, era esperado um volume maior, mas parte das entregas “escorregaram” para 2024, que deve manter o patamar de 2,3 milhões de m2.
A absorção líquida, medida pela diferença entre a área locada e a devolvida, foi de 2,2 milhões de m2, redução de 7,3% sobre 2022, motivada pela demanda mais fraca.
“Importante lembrar que começamos o ano muito impactados pelo caso da Americanas”, afirma Braga, citando ainda a taxa de juros alta, que desmotivou empresas do varejo. O destaque em locações no quarto trimestre, inclusive, não foi de empresas de comércio virtual, grandes locadoras durante a pandemia, mas de companhias de transporte, destaca a consultoria.
Para 2024, a expectativa é que a vacância fique perto de 11%.